Legislação civil
Legislação eclesiástica
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Análise global da legislação sobre vínculos nas Constituições diocesanas (séculos XVI-XVII)
A normativa sobre capelas inserida nas constituições diocesanas dos séculos XVI e XVII circunscreve-se a núcleos temáticos, relacionados essencialmente com a preservação da memória dos fundadores e dos encargos pios associados às respetivas fundações. Esta permaneceu relativamente estável ao longo do século XVI até à sua atualização e complexificação no século seguinte, nomeadamente no segundo terço e nos finais do século XVII.
1. Arquivos diocesanos
As constituições diocesanas do século XVII incluíam disposições sobre a constituição, organização e funcionamento dos arquivos estabelecidos (Portalegre, Lamego, Guarda, Porto e arquidiocese de Lisboa).
A normativa respeitava geralmente a necessidade de construção do mobiliário para conservação da documentação (armários com gavetas), a respetiva identificação sob a forma de etiquetas (letreiros) e a elaboração de auxiliares de pesquisa (inventário e índex geral dos livros e documentos). De igual modo, exigia-se que a documentação das igrejas da diocese fosse transcrita em livros e documentos a conservar no referido arquivo.
As disposições sobre estes arquivos centrais da diocese continham geralmente várias normas para o controlo do acesso, registando-se penalizações para quem retirasse livros. Este tipo de normas estendia-se à necessidade de petição para trasladar documentação, à visitação do prelado ao arquivo e à necessidade de autorização episcopal para empréstimo de documentos.
2. Arquivos paroquiais
O tema do arquivamento de documentação pertencente a igrejas paroquiais surgiu nas constituições diocesanas desde o início do século XVI, com o estabelecimento da obrigatoriedade da feitura de um móvel específico para essa conservação: uma arca dotada de duas fechaduras, a ser instalada na igreja num prazo que podia variar entre os três meses e um ano. Essa exigência foi geralmente acompanhada da obrigatoriedade de colocação das escrituras na arca (no prazo de quinze-trinta dias) e da elaboração de um inventário da documentação aí conservada. A partir de 1537, a saída de documentos passou a ser controlada através da colocação na arca de um «reconhecimento», ficando o empréstimo documental adscrito à necessidade de apresentação de um penhor.
Esta normativa recebeu um conjunto de precisões no século XVII. Por um lado, especificou-se que o móvel deveria ser um armário com gavetas (ou no mínimo uma arca), igualmente com duas fechaduras, a ser colocado nas sacristias ou nas capelas-mores das igrejas, no prazo de um ano. A partir do final do século, determinou-se que os «livros e papéis» da igreja permaneceriam separados dos livros dos batizados, crismados, casados e defuntos e o das visitações, através do seu arquivamento numa outra gaveta, ou numa divisória especifica, dotada de fechadura própria e de acesso reservado exclusivamente ao pároco.
3. Livros de registo
A obrigatoriedade de elaboração de um livro de tombo, em pergaminho, constava das constituições diocesanas desde o início do século XVI, variando somente o prazo outorgado para a sua realização entre os dois meses e os três anos. Nestes registos, elaborados em duplicado (uma cópia para a igreja e outra para a respetiva Sé), deviam constar os traslados integrais (de verbo a verbo) da documentação das capelas existentes na igreja. O trabalho deveria ser realizado no prazo de um ano e às custas dos respetivos administradores, de modo a que ficassem registados o número de capelas, a identificação dos capelães que nelas servissem, os encargos pios celebrados e o património associado.
As disposições no século XVII estabeleceram várias precisões. Desde logo, fixou-se a possibilidade do tombo ser feito em papel, o qual deveria ser «grande e grosso», para assegurar a sua conservação ao longo do tempo. A possibilidade de utilização em papel tornou-se norma a partir de 1632, juntamente com a indicação da sua encadernação com recurso a material durável (madeira ou pasta de papel). O tombo deveria conter os traslados dos documentos relacionados com o cumprimento dos encargos pios, sendo as constituições diocesanas específicas sobre os contornos da elaboração desses traslados, incluindo por vezes o modelo diplomático a seguir pelo notário ou pelo tabelião.
De igual modo, precisava-se que a informação relacionada com os encargos litúrgicos (registo de missas, ofícios, aniversários, responsos, comemorações, entre outras) deveria ser consignada em livro (ou caderno) específico, elaborado pelo pároco em duplicado (uma cópia para si e outa para o arquivo da respetiva Sé), no prazo que podia variar entre trinta dias a seis meses. O registo deveria conter as verbas dos documentos que provassem os referidos encargos (instituições, doações, testamentos), devendo o seu traslado seguir procedimentos específicos, como dão conta os modelos diplomáticos a serem usados pelos notários e tabeliães públicos nas Constituições de Lisboa (1656) e da Guarda (1686).
4. Tábuas
A preservação da memória dos encargos pios em cada igreja encontrava-se igualmente patente na obrigatoriedade de elaboração de uma tábua, destinada a receber o seu registo (capelas perpétuas, aniversários e memórias). Subsistiu uma grande estabilidade nesta normativa específica ao longo do século XVI. Referenciadas a partir de 1534, as tábuas teriam de ser colocadas no coro da igreja (ou na sua sacristia se não existisse coro), no prazo de seis meses. Como forma de assegurar o seu controlo, as tábuas deveriam ser assinadas pelo visitador e pelo escrivão aquando da visitação canónica. A partir do segundo terço do século XVI, estabeleceu-se a possibilidade da sua substituição por um livro ou um caderno especificamente elaborado para esse fim.
As disposições sobre este tema tornaram-se muito menos recorrentes ao longo do século XVII. Somente as constituições de Lamego (1683) referem algo da sua funcionalidade: tinham de estar visíveis (patentes) para que pudessem ser consultadas (lidas) e assim evitar a consulta dos livros de registo.
5. Visitar propriedades (disposições relativas a vínculos)
A normativa sobre a inspeção do património das capelas permaneceu bastante estável ao longo do século XVI, em termos da sua periodicidade (anual ou bianual) e os seus agentes (dois beneficiados). Menos frequentes nas constituições diocesanas do século XVII, observou-se nessa altura uma maior abertura das suas disposições, tanto ao nível dos agentes (agora uma ou duas pessoas, sabedoras do seus ofício e não necessariamente clérigos beneficiados), quanto dos prazos para a sua realização, agora fixados até ao máximo de três anos.
6. Capelães e apontadores
As constituições diocesanos dos séculos XVI e XVII comportaram poucas disposições sobre esta temática, geralmente restrita à obrigatoriedade do registo da celebração de missas por oficiais específicos (apontadores). A partir dos finais do século XVI, os capítulos sobre esta questão específica passaram a referir a obrigatoriedade dos capelães em declarar as remunerações decorrentes das missas celebradas.
7. Insígnias em capelas
As disposições sobre esta questão específica surgiram nas Constituições do Porto (1585), nas quais se determinou a proibição de colocação nas capelas de panos com a representação de hereges. A questão da existência de «insígnias» nas capelas ressurgiu no século XVII, através da proibição de colocação de escudos de armas e de outras insígnias em igrejas e capelas, sem a necessária e especial autorização do bispo, podendo os visitadores ordenar a remoção das insígnias não autorizadas. Excetuam-se desta disposição os fundadores de capelas. Em várias Constituições consta a obrigatoriedade dos documentos relativos a esta questão (os autos) serem enviados ao cartório do bispado.
Regimentos de visitadores.
Além das Constituições, a normativa diocesana previa a inspeção das instituições pias e religiosas através do mecanismo da visitação canónica. Esta última dispunha de uma regulamentação própria, compilada em regimentos dos visitadores, os quais poderiam ser publicados de forma autónoma, integrados no interior de Regimentos dos Auditórios Eclesiásticos ou ainda apensos às constituições diocesanas.
A maior parte dos regimentos compulsados refere a obrigatoriedade da visitação das capelas fundadas em igrejas e ermidas, ainda que a questão seja colocada de forma bastante genérica, em torno do dever do visitador em tomar as suas contas e verificar o cumprimento dos encargos litúrgicos que os seus fundadores haviam estabelecido (Portalegre, 1632; Lamego, 1583; Porto, 1690). Estes regimentos poderiam ainda conter raras disposições sobre a obrigação do visitador em inspecionar os registos escritos pertencentes às capelas (Portalegre, 1632; Coimbra, 1674-1700) e verificar que os mesmos fossem transcritos em livro (Évora, 1598).