Datas extremas de atividade

No âmbito específico dos vínculos, após as medidas de grande fôlego preconizadas por D. Manuel1Rosa, 2012, p. 276-288., a ação da Coroa parece ter-se caracterizado por uma certa intermitência, que se manterá até 1619. O  Regimento da Provedoria das Capelas e Resíduos de Lisboa, datado de 6 de dezembro de 1564, vem regulamentar a atuação régia (apenas em Lisboa) na atribuição de administrações de capelas e morgadios com administração vacante, mas não aponta para um trabalho continuado, sobretudo, com a profundidade da ação manuelina.

É nesse contexto que deve ser entendido o recenseamento de capelas e morgadios empreendido em 1574 por António de Castilho, Guarda-mor da Torre do Tombo que, coadjuvado pelo escrivão Cristóvão de Benavente e pelo padre Nuno de Arez, elaborou o “Livro em o qual per madado del Rei se colegio de toda a leitura da torre do tombo todas as igrejas […] capellas que algu[n]s Reis e rainhas e Iffantes oredenaraõ, e assi todas as mais capellas de seus vassalos em que os ditos Reis prouero[m] de administradores […]”2Publicado com introdução de Joaquim Veríssimo Serrão sob o título de “Livro das igrejas e capelas do padroado dos reis de Portugal: 1574”, Paris: Fundação Calouste Gulbenkian Centro Cultural Português, 1971 (referindo a existência de exemplares noutras bibliotecas)..

Com o advento da Monarquia Dual, principalmente a partir de Filipe II (1598-1621) verifica-se o surgimento de medidas que, paulatinamente, vão contribuir para o desenvolvimento de uma atuação consistente e duradora no tempo, materializada sob a forma de um Juízo das Capelas da Coroa, entendido como parte integrante da Casa da Suplicação, tribunal supremo do Reino.

Os tempos iniciais deste processo liderado por Filipe II permanecem, por enquanto, um pouco obscuros, em boa parte pela ausência e dispersão de fontes de informação reveladoras da sua ação e enquadramento burocrático e administrativo na cúpula dos poderes do centro. Acresce a diversidade de designações coevas que foram atribuídas aos organismos que então foram criados: «Juízo das Capelas da Coroa», «Comissão das Capelas Sonegadas», «Junta do Tombo das Capelas», «Comissão das Capelas alheadas à Coroa», entre os mais comuns3Também foi designada de “Junta em que se trata da manifestação e tombo das Capelas que pertencem à Coroa”; “Comissão das Capelas”, “Junta das Capelas da Coroa”, “Junta das Capelas” eJunta em que se trata do tombo e averiguação das capelas que pertencem à Coroa”.. É certo, contudo, que esta fase inicial, caracterizada por uma certa complexificação e modernização burocrático-administrativa, pode ser dividida em duas etapas.

A primeira etapa terá decorrido entre fevereiro de 1604 e 1605. Está relacionada com a nomeação, em Fevereiro de 1604, do Desembargador da Casa da Suplicação Gaspar Leitão Coelho para Juiz das Capelas da Coroa4Traslado do alvará de nomeação de Gaspar Leitão Coelho para Juiz das Capelas da Coroa, in Livro do registo das leis, decretos e mais papéis, TT, Conselho da Fazenda, liv. 476, fol. 1. O livro 476 do Conselho da Fazenda constitui-se como um repositório de documentos normativos do funcionamento do Juízo das Capelas da Coroa, assinado e rubricado por Pedro de Melo Breyner, Juiz das Capelas da Coroa em 1790. É composto por duas partes distintas: a primeira, em que são trasladados e autenticados em bloco, em 14.04.1790 por Frutuoso Álvares de Carvalho, Escrivão do Juízo das Capelas da Coroa, um conjunto de 83 diplomas que existiam já por traslado num livro do Juízo rubricado por um “Matoso”; a segunda parte, em que vão sendo acrescentados e “concertados” os traslados das leis e demais normativas aplicáveis ao referido Juízo pelos sucessivos escrivães do Juízo. Apesar de a primeira parte do livro conter lacunas, principalmente no que se refere às datas dos diplomas e às fontes primeiras dos documentos, optamos por considerar esta fonte como primordial para o presente trabalho, indicando sempre que possível a existência dos diplomas em análise noutras localizações.. Deveria autuar e despachar com Belchior Pimenta e André de Melo, também desembargadores, e na falta de um deles, com o que o Regedor da Casa da Suplicação nomeasse. No desempenho da sua missão, o coletivo de desembargadores deveria fazer uso de “todos os papéis que acerca disto me apresentou João de Mendonça Furtado”5Traslado do alvará de nomeação do desembargador Gaspar Leitão Coelho para Juiz das Capelas da Coroa. Livro do registo das leis, decretos e mais papéis, TT, Conselho da Fazenda, liv. 476, fol. 1., identificado numa carta de administração de capela como “meu procurador na matéria das capelas vagas”6Carta de administração da capela instituída por Bento Martins dada a João de Mendonça Furtado em dias de sua vida. 1608.12.09 (TT, Chancelaria Régia, Filipe II, Privilégios, Livro 2, fol. 148-148v)., que desempenhou a sua missão de arrolamento das capelas da coroa entre 1604 e 16057Alvará de nomeação de João de Mendonça Furtado para aclarar e mostrar as capelas e prazos que estão vagos e sonegados à Coroa, dado em Fevereiro de 1604. (Livro do registo das leis, decretos e mais papéis, liv. 476, fol. 1)..

Os resultados desta “comissão” cingem-se à “relação” ou “livro” contendo cerca de 357 capelas e morgadios identificados, até 1605, por Mendonça Furtado, a partir dos livros das Chancelarias Régia, do qual apenas temos notícia através da “Recopilação das Capellas da Coroa”, equivocadamente designado de “Borrador” de Tomé Pinheiro da Veiga8TT, Feitos da Coroa, Livros das Capelas da Coroa, 9 – “Borrador”, fol. 8.. Não conhecemos evidências da ação dos desembargadores Gaspar Leitão Coelho, Belchior Pimenta e André Melo, sendo provável que não tenham avançado para a realização dos tombos das capelas sonegadas e consequentemente para a regularização das suas administrações. A impossibilidade de identificação integral do vasto universo de Capelas da Coroa parece ter-se constituído como um óbice ao desenvolvimento desta empresa.

Em 1612, Diogo de Castilho Coutinho, fidalgo da Casa de Sua Majestade, foi nomeado para Guarda-mor da Torre do Tombo9Carta de nomeação de Diogo de Castilho Coutinho para Guarda-mor da Torre do Tombo. 1612.10.11 (TT, Chancelaria Régia, Filipe II, Doações, Ofícios e Mercês, Livro 30, fol. 70-70v).. Entre outras tarefas desenvolvidas, concluiu, em inícios de Janeiro de 1619, a identificação e inventariação de capelas e morgadios sonegados a partir das chancelarias régias10Alvará de mercê de uma capela que valha 200$000 réis dado a Diogo de Castilho Coutinho. TT, Chancelaria Régia, Filipe II, Doações, Ofícios e Mercês, liv. 44, fol. 49.. Na documentação existente na Torre do Tombo, Diogo de Castilho confirmou a existência dos 357 vínculos já identificados por Mendonça Furtado, mas acrescentou mais 89 que também andariam sonegados à Coroa.

Seria, assim, um total de 446 capelas e morgadios que se constituíra como a base de trabalho para a segunda etapa da atuação desta comissão, que se iniciaria em Outubro de 1619 e se prolongaria ininterruptamente, pelo menos, até 164311Em 11 de Novembro de 1643, Tomé Pinheiro da Veiga recebeu um alvará para renunciar em seu filho a administração da capela de Vicente André, em Viana do Alvito, em consideração aos 36 anos de serviço nos lugares de Letras, entre eles o de “Juiz do Tombo das Capelas”, particularmente no cargo de Procurador da Coroa e na comissão das Capelas “que tem à sua conta”. TT, Chancelaria Régia, D. João IV, liv. 16, fol. 138v-139. Não nos parecesse crível que Pinheiro da Veiga tenha tido a comissão a seu cargo até ao seu falecimento porquanto teria 90 anos. Machado, 1752, tomo III, p. 758-760; Silva, 1908, tomo XIX, p. 284-285.. A sua praxis criou as bases para o surgimento de um Juízo específico e exclusivo, no seio da Casa da Suplicação, para dirimir as questões relacionadas com as instituições vinculares. O personagem central foi o doutor Tomé Pinheiro da Veiga, Juiz dos Feitos da Coroa e Juiz da Chancelaria da mesma Casa (1614)12Carta de nomeação do licenciado Tomé Pinheiro da Veiga para Juiz dos Feitos da Coroa e Juiz da Chancelaria Régia. 1614.03.15. TT, Chancelaria Régia, Filipe II, Doações, Ofícios e Mercês, livro 29, fol. 292-292v. e Desembargador da Casa da Suplicação (1617)13Carta de nomeação do bacharel Tomé Pinheiro da Veiga para Desembargador da Casa da Suplicação. 1617.02.14. TT, Chancelaria Régia, Filipe II, Doações, Ofícios e Mercês, livro 43, fol. 6v. que, em 14 de Outubro de 1619, foi nomeado por alvará régio para levar a cabo um vasto conjunto de medidas no sentido de dar continuidade ao trabalho de tombar os bens das Capelas da Coroa e legitimar os administradores de capelas que não possuíssem título válido. Para tal, deveria proporcionar o prazo de dois meses para os que vivessem em Lisboa e de quatro meses para os que vivessem noutros lugares do reino; e em relação às capelas que já tivessem sido julgadas, proceder-se-ia à execução da respectiva sentença, não sendo concedida a oportunidade de serem denunciadas novamente14TT, Conselho da Fazenda, Livro do registo das leis, decretos e mais papéis,  liv. 476, fol. 2-2v. A provisão régia encontra-se transcrita numa grande parte dos tombos que então se realizaram e que subsistem nos Livros das Capelas da Coroa, como por exemplo TT, Feitos da Coroa, Livros das Capelas da Coroa, Livro 1, fols. 118; 122; 158; 191v; 197; 319; 323v..

Pinheiro da Veiga veria ser-lhe nomeados dois adjuntos para Comissão, o doutor Nuno da Fonseca Cabral e o doutor Gabriel Pereira de Castro, ambos desembargadores dos Agravos da Casa da Suplicação15Nomeação de adjuntos pelo Regedor da Casa da Suplicação. TT, Conselho da Fazenda, Livro do registo das leis, decretos e mais papéis,  liv. 476, fol. 2-2v.. A Comissão reportava directamente ao rei. O ponto de partida para a empresa seriam o livro de Diogo de Castilho e a lista que anteriormente tinha elaborado João Furtado de Mendonça.

O trabalho da Comissão na identificação das capelas iniciou-se logo no final de 1619, princípios de 1620, e direcionou-se em duas frentes. A primeira, realizada através da consulta de vasta documentação existente na Torre do Tombo, terá perdurado até 1625, resultou numa extensa relação de capelas, morgadios, prazos, hospitais e albergarias cujo direito de nomeação pertencia a Coroa, que se designou de forma conjunta e genérica, como «Capelas da Coroa»16Ao livro que então foi produzido, atribuiu-se o título de “Recopillação das capelas da Coroa reduzidas aa ordem do alphabeto pellos nomes das terras em que estão para apuração dos que vierão nos roles e auerigoação das que lhe pertencem, e se ir lançando nella tudo o que se vai achando e auerigoando”. TT, Feitos da Coroa, Livros das Capelas da Coroa, 9 – “Borrador”. . Na segunda, a partir de 1622, ter-se-á iniciado a realização dos tombos pelas provedorias e comarcas do Reino, não só inventariando os bens, mas também dirimindo os pleitos para apuramento do direito de administração dos institutos vinculares.

A partir da documentação consultada, Tomé Pinheiro da Veiga identificou mais 226 capelas, morgadios e prazos, perfazendo um total de 672 vínculos, até à década de 40 do século XVII, cujo direito de nomeação da administração pertencia à Coroa17Dados apurados através da análise crítica do livro da “Recopillação das Capelas” ou “Borrador” de Tomé Pinheiro da Veiga (TT, Feitos da Coroa, Livros das Capelas da Coroa, 9 – “Borrador”), que está ser desenvolvida no âmbito da tese de doutoramento de Abel Rodrigues intitulada “Para o serviço de Deus e do Rei: a gestão da informação das Capelas da Coroa (Portugal, séculos XV-XVII)..

Documentos normativos (principais)

  • Regimento do provedor das capelas e resíduos de Lisboa de 6 de dezembro de 1564, com as alterações introduzidas pelo alvará de 15 de Março de 1566 e pelo alvará de 15 de Dezembro de 156618Lião, 1569, parte 1, tít. 15, leis I, II e III fls. 38v-40; 40v; 40v-41v); ver apenas o Regimento de 1564 em PMM4, p. 119-121.;
  • Alvará de 14 de Outubro de 1619, nomeando o Desembargador Tomé Pinheiro da Veiga para tombar as capelas da Coroa que andassem sonegadas, com os adjuntos que lhe nomear o Regedor da Casa da Suplicação19TT, Conselho da Fazenda, Livro do registo das leis, decretos e mais papéis,  liv. 476, fol. 2-2v. A provisão régia encontra-se transcrita numa grande parte dos tombos que então se realizaram e que subsistem nos Livros das Capelas da Coroa, como por exemplo em TT, Feitos da Coroa, Livros das Capelas da Coroa, Livro 1, fols. 118; 122; 158; 191v; 197; 319; 323v.;
  • Alvará de 1 de Dezembro de 1620 como aditamento às instruções anteriores, ordenando a utilização do Regimento da Provedoria e a nomeação de tesoureiro20TT, Conselho da Fazenda, Livro do registo das leis, decretos e mais papéis,  liv. 476, fol. 4-5.;
  • Alvará ordenando a nomeação pelo Desembargo do Paço de um Solicitador das Capelas da Coroa, c. 162021TT, Conselho da Fazenda, Livro do registo das leis, decretos e mais papéis,  liv. 476, fol. 3-3v.;
  • Carta régia de 13 de Outubro de 1621 ordenando que se cumpra pontualmente os encargos da capelas sequestradas por conta dos seus rendimentos22TT, Conselho da Fazenda, Livro do registo das leis, decretos e mais papéis,  liv. 476, fol. 5.;
  • Carta régia ordenado o registo nos livros da comissão do doutor Tomé Pinheiro da Veiga das provisões que se passarem para tirar capelas litigiosas, c. 162223TT, Conselho da Fazenda, Livro do registo das leis, decretos e mais papéis,  liv. 476, fol. 6v.;
  • Carta régia ordenando que as denúncias das capelas sejam efetuadas no período de um ano, c. 162724TT, Conselho da Fazenda, Livro do registo das leis, decretos e mais papéis,  liv. 476, fol. 9v-10.;
  • Carta régia de 28 de Novembro de 1628 ordenando que nenhum desembargador ou ministro da Comissão das Capelas possa denunciar para si, criados ou parentes até 4º grau qualquer capela25TT, Conselho da Fazenda, Livro do registo das leis, decretos e mais papéis,  liv. 476, fol. 7v-8.;

Competências

À Comissão competia identificar as Capelas da Coroa, tombar os seus bens, proceder à regularização das administrações sem título válido, dando um prazo de dois meses para os que vivem em Lisboa e de quatro meses para os que vivem noutros lugares do reino para ser realizarem o respetivo tombo; executar as sentenças de capelas já tombadas, sem admitir novas denúncias para as mesmas28Alvará de 14 de Outubro de 1619, nomeando o Desembargador Tomé Pinheiro da Veiga para tombar as capelas da Coroa que andassem sonegadas, com os adjuntos que lhe nomear o Regedor da Casa da Suplicação. TT, Conselho da Fazenda, Livro do registo das leis, decretos e mais papéis,  liv. 476, fol. 2-2v.. A criação e manutenção de um registo atualizado do provimento de administrações, em articulação com os organismos da administração central e da administração periférica, laica e eclesiástica, ordenar sequestro dos bens para a realização dos tombos, proferir sentenças e lavrar autos de posse dos vínculos29Ed. PMM4, p. 120. OF, liv. 1, tit. L..

Orgânica da instituição e funções dos seus agentes em temática vincular

Orgânica da instituição

A Comissão teve uma estrutura orgânica diminuta. Era composta por três desembargadores, sendo que um presidia, enquanto Juiz do Tombo, nomeado pelo rei – Tomé Pinheiro da Veiga55Alvará de 14 de Outubro de 1619, nomeando o Desembargador Tomé Pinheiro da Veiga para tombar as capelas da Coroa que andassem sonegadas, com os adjuntos que lhe nomear o Regedor da Casa da Suplicação. TT, Conselho da Fazenda, Livro do registo das leis, decretos e mais papéis,  liv. 476, fol. 1. – e dois adjuntos, nomeados pelo Regedor da Casa da Suplicação – Nuno da Fonseca Cabral e Gabriel Pereira de Castro56Apostila ao alvará de nomeação de Tomé Pinheiro da Veiga, nomeando Nuno da Fonseca Cabral e Gabriel Pereira de Castro para seus adjuntos. TT, Conselho da Fazenda, Livro do registo das leis, decretos e mais papéis,  liv. 476, fol. 1v.; um Solicitador, nomeado pelo Desembargo do Paço57Carta para haver solicitador das Capelas nomeado pelo Desembargo do Paço. TT, Conselho da Fazenda, Livro do registo das leis, decretos e mais papéis,  liv. 476, fol. 3-3v..

Terá contado com o Escrivão dos Feitos da Coroa para instruir os processos relativos à ação da Comissão das Capelas da Coroa58As competências dos Escrivão dos feitos da Coroa estão descritas nas OF, Liv. 1, tít. XXIII, p. 59-60.; e um tesoureiro59Alvará de 1 de Dezembro de 1620 como aditamento às instruções anteriores, ordenando a utilização do Regimento da Provedoria e a nomeação de tesoureiro. TT, Conselho da Fazenda, Livro do registo das leis, decretos e mais papéis,  liv. 476, fol. 4-5..

As funções dos seus agentes

Juiz do Tombo
Competia-lhe liderar a Comissão, sendo responsável pelo recenseamento e identificação dos vínculos; criação de um livro e relação atualizada das Capelas da Coroa; verificação das contas dos vínculos; requisição de certidões de testamentos e de autos de contas dos vínculos às provedorias e às igrejas onde se celebravam os sufrágios pios; proferir sentenças de tombos e acórdãos sobre as demandas em torno da posse dos vínculos; determinar os sequestros de bens e lavrar autos de posse.

As competências deste magistrado eram, sobretudo, reguladas pelo Regimento do Provedor das Capelas e Resíduos de Lisboa (1564) (ver ficha deste cargo), transpostas e actualizadas para as Ordenações Filipinas60OF, vol. 1, liv. 1, tít. L, §1-16, p. 93-96., que foi adotado pela Comissão em 1 de Dezembro de 1620:

  • Capelas
    • Conhecer as instituições61Ed. PMM4, p. 119; OF, liv. 1, tit. L, prólogo.;
    • Tomar conta das rendas e encargos62Ed. PMM4, p. 119; OF, liv. 1, tit. L, prólogo.;
    • Julgar os processos sobre as capelas e sua administração63Ed. PMM4, p. 120; OF, liv. 1, tit. L, §1.;
    • Emitir sentenças interlocutórias e finais pertencentes a estas instituições e, inclusivamente, sobre dúvidas surgidas na prestação de contas, embora impondo-lhe o limite (alçada) de quatro mil reais nos pleitos sobre bens de raiz e seis mil reis nos bens móveis, montantes até aos quais eles poderiam julgar sem apelo nem agravo64Ed. PMM4, p. 120..
    • Demarcar e medir os seus bens e propriedades65Ed. PMM4, p. 120; OF, liv. 1, tit. L, §2.;
    • Mandar tombar o referido património em livro de tombo, com os traslados das instituições66Ed. PMM4, p. 120.;
    • Elaborar anualmente um caderno das capelas providos pelo provedor e dos tombos começados, devendo enviar os referidos cadernos aos Desembargadores do Paço67Ed. PMM4, p. 120; OF, liv. 1, tit. L, §3.;
  • Morgadios
    • Conhecer as suas instituições68Ed. PMM4, p. 119; OF, liv. 1, tit. L, prólogo.;
    • Tomar conta das suas rendas e encargos69 Ed. PMM4, p. 119; OF, liv. 1, tit. L, prólogo.;
    • Julgar os processos sobre os seus encargos e respetivas contas70Ed. PMM4, p. 120; OF, liv. 1, tit. L, §1.;

Adjuntos do Juiz do tombo
Em número de dois, eram nomeados pelo Regedor da Casa da Suplicação e competia-lhes coadjuvar o Juiz do Tombo no cumprimento das funções71Apostila ao alvará de nomeação de Tomé Pinheiro da Veiga, nomeando Nuno da Fonseca Cabral e Gabriel Pereira de Castro para seus adjuntos. TT, Conselho da Fazenda, Livro do registo das leis, decretos e mais papéis,  liv. 476, fol. 1v., proferindo acórdãos em relação.

Solicitador
Era nomeado pelo Desembargo do Paço e exercia funções sob juramento, para procurar por tombos da parte da Coroa e fazer as mais diligências que parecessem necessárias72Alvará ordenando a nomeação pelo Desembargo do Paço de um Solicitador das Capelas da Coroa, c. 1620. TT, Conselho da Fazenda, Livro do registo das leis, decretos e mais papéis,  liv. 476, fol. 3-3v..

Escrivães
De acordo com o Regimento do Provedor das Capelas e Resíduos de Lisboa (1564) competia aos escrivães redigir instrumentos pertencentes «às coisas» de capelas, encargos de morgados, hospitais, albergarias e confrarias. Encarregavam-se igualmente da escrituração das apelações que se davam do provedor, bem como da solicitação para o seu despacho junto das instâncias superiores de recurso73Ed. PMM4, p. 121, atualizada em OF, liv. 1, tit. 50, §16. .

O Escrivão dos Feitos da Coroa74No cartório do Juízo das Capelas da Coroa, que está a ser inventariado no âmbito da tese de doutoramento de Abel Rodrigues, observámos que a instrução dos processos de denúncia de capelas, tombos e restantes demandas judiciais esteve acometida a Pedro Lamirante que foi proprietário do ofício de “Escrivão da Coroa e dos Padroados” entre 1620 e 1644. (Alvará concedendo licença a Pedro Lamirante para renunciar o ofício em seu filho. 1644.03.04. TT, Registo Geral de Mercês, Mercês da Torre do Tombo, livro 9, fol. 121-122)., que exerceu funções no Juízo das Capelas da Coroa durante a segunda metade de Seiscentos, tinha a seu cargo guardar os feitos e fazer inventário dos mesmos, dando-os a consultar ao Procurador da Coroa para serem desembargados; fazer todas as cartas de qualquer desembargo para se tirarem inquirições e dá-las a assinar ao Juiz ou a quem houvesse de as assinar e, depois, ao solicitador para as fazer selar75OF, Liv. 1, tít. XXIII, § 1, p. 59.; fazer assinar as sentenças definitivas que, depois, passariam pela Chancelaria e seriam trasladadas num livro. Daria as sentenças depois de executadas ao Guarda-mor da Torre do Tombo para serem trasladadas em livro próprio76OF, Liv. 1, tít. XXIII, § 2, p. 59.. O escrivão dos Feitos da Coroa daria traslados dos feitos, sendo mandado pelo Juiz77OF, Liv. 1, tít. XXIII, § 3. p. 59-60.; assim como faria os traslados dos tombos dos vínculos78OF, Liv. 1, tít. XXIII, p. 59-60..

Tesoureiro
Seria “pessoa confidente” e teria a seu cargo o livro de receita e despesa da Comissão79Alvará de 1 de Dezembro de 1620 como aditamento às instruções anteriores, ordenando a utilização do Regimento da Provedoria e a nomeação de tesoureiro. TT, Conselho da Fazenda, Livro do registo das leis, decretos e mais papéis,  liv. 476, fol. 4-5..

Relações com outras instituições sobre temática vincular

As relações com outras instituições verificam-se ao nível da administração central e da administração periférica.

Ao nível da administração central, é de realçar o contacto direto com o Rei80TT, Conselho da Fazenda, Livro do registo das leis, decretos e mais papéis,  liv. 476, fol. 2-2v., vértice superior do sistema regulador, a quem competia a definição desse mesmo sistema, seja em matéria de nomeação de agentes, seja na emissão de normativas que definem o funcionamento da comissão e, ainda, na atribuição direta de mercês de administração de capelas, ouvindo ou não o Desembargo do Paço.

Por delegação régia, os Governadores do Reino e em especial os vice-reis de Portugal durante o período da monarquia dual podiam atribuir administrações de capelas da Coroa81Traslado parcial do Regimento, autógrafo de Tomé Pinheiro da Veiga, em TT, Feitos da Coroa, Livro 9 das Capelas da Coroa dito “Borrador”, fol. 11v; v. também Silva, Collecção Chronologica, 1854-1859, vol. 4, p. 228.; e a partir de 12 de Março de 1635, também a Princesa D. Margarida de Sabóia, duquesa de Mântua, vice-rainha de Portugal, alcançou faculdades nesse âmbito, devendo informar de tudo a “Thome Pinheiro da Veiga fazendo-se nas consultas destes provimentos declaração da conta que eras capellas rendem”82Traslado parcial do Regimento da Senhora princesa Margarida, autógrafo de Tomé Pinheiro da Veiga, em TT, feitos da Coroa, Livro 9 das Capelas da Coroa dito “Borrador”, fol. 12. v. também Silva, Collecção Chronologica, 1854-1859, vol. 4, p. 229..

O Procurador dos Feitos da Coroa participava nos trabalhos da Comissão competindo-lhe representar a Coroa, defender os seus direitos e a sua jurisdição; requerer todas as informações respeitantes aos seus direitos; efectuar inquirições em nome do rei; ser autor, réu, opoente ou assistente nos feitos e causas que envolvessem vínculos83OF, Liv. I, tít. XII, p. 39-41..

Ao nível da administração periférica era especialmente relevante o canal de comunicação com vários agentes e organismos para obter informação acerca da existência de testamentos e outras documentos fundacionais de vínculos, bem como de informações sobre a vacatura das administrações e requisições de certidões sobre outra documentação que estivesse em falta nos arquivos da coroa. Competia também a esses oficiais tomar posse e colocar em arrecadação os bens dos vínculos, bem como liderar a equipa que procedia à realização dos tombos84Ver os procedimentos adoptados nos tombos, especificamente nos autos de medição, existentes em TT, Feitos da Coroa, Livros das Capelas da Coroa, 1 a 7.. Neste plano, devem ser salientados os provedores das comarcas, que tutelavam os vínculos que não fossem de fundação ou administração eclesiástica, nem estivessem sob a proteção do rei85Hespanha, 1994, p. 208., os corregedores86Sobre a elaboração de tombos pelos corregedores fora da sua jurisdição, com fixação de ordenado, v. Ordenações Filipinas, Liv. I, tít. LVIII, § 55. e outras instituições como o Juízo dos Resíduos e Capelas, no caso da Madeira87Sousa, 2019..